Gota e Metabolismo: O papel essencial da endocrinologia no controle do ácido úrico

A gota é um distúrbio metabólico caracterizado pelo acúmulo de ácido úrico no organismo, resultando na formação de cristais de monourato de sódio nas articulações. Esse processo leva a episódios de artrite inflamatória intensa e, se não tratado, pode evoluir para complicações sistêmicas. Sendo uma condição associada ao metabolismo do ácido úrico, a abordagem endocrinológica se faz essencial para o manejo adequado dos fatores metabólicos subjacentes.

Fisiopatologia

A hiperuricemia ocorre devido a um desequilíbrio entre a produção e a excreção renal do ácido úrico. A produção excessiva pode estar relacionada ao aumento do metabolismo de purinas, enquanto a redução da excreção renal é o principal fator em grande parte dos casos. Esse acúmulo de ácido úrico leva à formação de cristais nas articulações, desencadeando uma resposta inflamatória mediada pelo sistema imune inato, com ativação de macrófagos e neutrófilos.

Prevalência

A gota tem uma prevalência crescente devido a fatores como dieta inadequada, obesidade e síndrome metabólica. É mais comum em homens acima dos 40 anos e mulheres pós-menopausa. A associação com resistência insulínica e dislipidemia reforça a necessidade de uma abordagem endocrinológica no seu tratamento.

Sinais e Sintomas

Os episódios agudos de gota são caracterizados por:

  • Dor intensa e súbita em uma articulação, mais frequentemente na primeira articulação metatarsofalângica (podagra);
  • Vermelhidão, edema e calor local;
  • Limitação do movimento da articulação acometida;
  • Febre leve pode estar presente.

A forma crônica da doença leva ao desenvolvimento de tofos (acúmulos subcutâneos de cristais de urato) e possível destruição articular.

Diagnóstico

O diagnóstico é clínico, podendo ser confirmado por:

  • Identificação de cristais de monourato de sódio no líquido sinovial por microscopia de luz polarizada;
  • Exames laboratoriais demonstrando hiperuricemia (>6,8 mg/dL);
  • Exames de imagem como ultrassonografia e tomografia por dupla energia para detectar depósitos de urato.

Fatores Desencadeantes

A gota pode ser precipitada por diversos fatores que aumentam os níveis de ácido úrico ou induzem uma resposta inflamatória. Entre os principais desencadeantes, destacam-se:

  • Dieta rica em purinas, como carne vermelha, frutos do mar e bebidas açucaradas;
  • Consumo excessivo de álcool, especialmente cerveja e destilados;
  • Uso de medicamentos, como diuréticos tiazídicos, ácido acetilsalicílico em baixas doses e ciclosporina;
  • Desidratação, que reduz a excreção renal do ácido úrico;
  • Cirurgias ou traumas, que podem induzir alterações metabólicas;
  • Doenças metabólicas associadas, como obesidade, resistência insulínica e insuficiência renal;
  • Jejum prolongado ou dietas restritivas, que podem levar à cetose e precipitação da crise gotosa.

 

Riscos e Complicações

A gota não tratada pode evoluir para:

  • Deformidades articulares e osteoartrite secundária;
  • Nefropatia úrica e cálculos renais;
  • Aumento do risco cardiovascular, devido à inflamação crônica e associação com síndrome metabólica.

Subtipos de Gota

  • Gota aguda: crises inflamatórias episódicas;
  • Gota intercrítica: período assintomático entre crises;
  • Gota crônica tofácea: presença de tofos e lesões articulares permanentes;
  • Gota secundária: associada a doenças metabólicas, uso de medicamentos que afetam a excreção de ácido úrico e outras condições subjacentes.

Tratamento

O manejo da gota envolve tanto o controle da inflamação quanto a correção das disfunções metabólicas subjacentes.

  1. Medicamentoso:
  • Crise aguda: Anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), como naproxeno e cetoprofeno, colchicina (disponível na forma industrializada e manipulada) e corticoides, como prednisona.
  • Redução de ácido úrico: Alopurinol e febuxostate (inibidores da xantina oxidase) são os principais fármacos disponíveis no Brasil. A benzbromarona, um uricosúrico, pode ser utilizada em casos específicos. O lesinurad (Leinurad), um inibidor seletivo do transportador URAT1, pode ser utilizado em combinação com inibidores da xantina oxidase para pacientes com resposta inadequada à monoterapia. Além disso, a colchicina também pode ser manipulada para ajustes de dose personalizados.
  • Novos medicamentos: Estão em fase de estudos e aprovação novas opções terapêuticas, como inibidores seletivos de uricase recombinante (ex.: pegloticase) e novas formulações de febuxostate para otimização do tratamento de pacientes refratários.
  1. Mudanças no Estilo de Vida:
  • Controle do peso corporal e da resistência insulínica;
  • Redução do consumo de álcool, carnes vermelhas, frutos do mar e bebidas açucaradas;
  • Aumento da ingestão de água para prevenir cálculos renais;
  • Dieta rica em vegetais, laticínios com baixo teor de gordura e cereais integrais;
  • Prática regular de atividade física.

A abordagem endocrinológica da gota deve enfatizar a relação da hiperuricemia com a síndrome metabólica e doenças cardiovasculares. O acompanhamento médico contínuo é fundamental para prevenir complicações e otimizar a qualidade de vida do paciente.

 Referências

  1. Sociedade Brasileira de Reumatologia. Diretrizes para o manejo da gota. Disponível em: www.reumatologia.org.br
  2. Marques Neto JF, et al. Revisão crítica do tratamento medicamentoso da gota no Brasil. Rev Bras Reumatol. 2017;57(Suppl 2):S382-S389. Disponível em: www.scielo.br
  3. Ministério da Saúde. Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas – Gota. Disponível em: www.gov.br/saude
  4. Lopes LC, et al. Evidências de revisões sistemáticas Cochrane sobre o tratamento da gota. Rev Diagn Tratamento. 2019;24(2):70-81. Disponível em: docs.bvsalud.org
  5. Heckler AP, et al. Gota: uma revisão da literatura. Revista Interdisciplinar de Ciências da Saúde. Disponível em: srvapp2s.santoangelo.uri.br

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